24.3.13

Uma espécie de humor social

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Ultimamente apercebo-me da necessidade dos que me rodeiam em contribuir para a criação de um common place, para a banalização de certas situações, certas formas de sentir, de experienciar, de entender, de errar.

Não sei se se deve a uma cultura televisiva elevada ao expoente máximo, se é uma tendência da globalização, se das narrativas e imaginários comuns mas é certo que vai emergindo e vão-se sentindo cada vez mais presentes e fortes algumas tendências na comunicação e nas relações sociais. É um tema com o qual não estou familiarizado ou que não estou apto para abordar cientificamente (fica já o aviso feito!), mas que é uma sensação que tenho tido, especialmente ao longo destes três anos de faculdade.

Nas relações sociais, distinguindo estas das mais intimistas, mesmo com amigos mais próximos, parecem ser exigidas cada vez mais as seguintes características dos intervenientes: noção de uma série de expressões em inglês tradicionais no ramo dos videojogos, séries televisivas ou filmes de culto; perspicácia; sentido de humor; e fundamentalmente, e acima de tudo, ser irónico sendo dúbio apenas nessas situações e afirmativo em tudo o resto.

Estas regras acentuam-se na tentativa de facilitar as relações com um maior número de pessoas possível, uma tendência facebookiana ou então, para não ser tão parcial, chamemos-lhe simplesmente social net tendence (à falta de melhor expressão em português). "Bitch Please!", "What the fuck!", "God!", "Oh my God!", "Genius!". Estas expressões podem parecer inofensivas mas são as novas bengalas linguísticas da comunicação e, subrepticiamente, as novas formas automáticas de fugir ao ridículo que é formular ideias e sentimentos próprios (um pouco como a velha resposta: —O que está a sentir? —Não há palavras! Não tenho palavras).

É normal que isso aconteça especialmente em relações efémeras ou com desconhecidos, mas não a toda a hora com amigos e pessoas mais chegadas. Talvez seja apenas a pressão normal de um grupo social, a expressão em público, facilitada pelos novos meios de comunicação e não se verifique tanto quando o grupo de interlocutores diminui. Acontece é que, como toda a comunicação serve para interpelar e propor (ou impor, se preferirem) algo, estas bengalas, que vão da mera língua à forma de experienciar, acabam não tanto por estimular o sentido crítico mas por embrutecer o discurso ao serem fruto do hábito e ao banalizarem e obstruírem algo de mais profundo ou sensível.

É como quando não gostamos (às vezes até gostamos) de um intérprete mais melancólico ou mais agressivo e comentamos que parece que está na casa de banho ou algo do género. Ainda hoje estava a ouvir uma música dos Madredeus no Youtube e, ao deparar-me com alguns comentários mais sensíveis ou deslumbrados, senti-me logo na necessidade de escarnecer o exagero de tais afirmações como a seguinte: “Sou como tu, da mesma luz, do mesmo amar! Muito bom Madredeus, na leveza da música e na profundidade das palavras”.

Esta expressão se calhar é mesmo banal mas a minha necessidade em me afirmar superior a certos sentimalismos, nesmo numa situação sem interesse como responder a comentários no Youtube,  é que me preocupou um bocado. Aquele certo embaraço de formular lamechices, “amo-te” ou “isso é lindissímo” com forte sinceridade, sem pudores e sem cair na piada fácil, na vontade de ser engraçado ou inteligentemente irónico.

O humor é prova de inteligência e maturidade mas pergunto-me se quando é usado em exagero e sem profundidade não será falta delas.